domingo, 15 de maio de 2011

FRAGMENTO ENTORDILHADO

            Dou-me a reserva da inquietude embalante, que a madrugada balança num tique-taque de horas. Viajando ao pensar solito, por esses fundões de adágios que arrinconaram querências e povoaram os descampados imensos com a simplicidade de um dito antigo. E ainda guardo por cismas, bater de frente com o outono, num frio que vem caborteiro nos cimos empinheirados da minha serra – querência –. Congelante e incessante é o tremor que bate num pé calçado de alpargata surrada, treme com o frio, treme com os assombros.  São tantos, entordilhados de tempos, os assombros que transluzem. Nascendo em ecos de vozes, relinchos de cavalos, zunidos de boleadeiras e pealos certeiros cucharreando a nostalgia... Regresso ao tempo guri que se extraviou nos janeiros, e volto assim bem montado, loro corto numa tordilha pançuda... Meu tempito de guri, minha tordilha da encilha, dois potros, mesma tropilha, ao recorrer campos vastos campeando a volta do nada, chegando à coisa nenhuma. Voltear sem rumo ou capricho, somente viajar nos braços de uma infância orelhana, melindrosa e destemida. Uma infância de bombacha, de chapéu e pé no etribo, onde o chão entordilhava-se com as geadas de um inverno. Pela florzita de campo – carinhosa margarida – guardava o sol, bem no centro, envolto por pétalas “entordilhadas”. Fragmentos de um passado que hoje vêm – melena branca – por rastrear nos corredores, silbar ventos, ver amores, nos setembrinos luzentes, vigorosos de colores mordiscados de ternura.
             Vejo assim entordilhada à madrugada em que estou, sereno lustrando a relva, saudades sulcando as lágrimas, meu peito é olhar parado, ao requisitar poesias de alguma alma extraviada, que só encontrou estrada, pra apear n’algum silêncio e erguer morada num verso de redondilha. Onde os assombros se achegam, pra remoçar um passado, na plenitude da noite, do tremulo pé de alpargata. Assombros que eram vidas, agora são quimereados e vertem nesses papeis por rabiscos desses loucos, que teimam falar de ontem. Esses tantos – madrugueiros – basteriados de tropeadas, vivências e gauchadas no plano retilíneo de uma vida torena. Que ao refugiar-se do mundo onde estão, vagueiam prum outro mundo, onde as almas são tordilhas, onde a rima é macia e o falar não é gritado.
            Um relógio de parede gira pedindo socorro, pois mal ele sabe que o tempo que ali transcorre é o “estar” pra muitos tantos, onde os atos são virtudes de quem sabe o que se vive, por mais que rengueie o corpo na volta de um tropicão, o passo é dado mais firme e vamos levando golpes, que a mão da vida forceja, pra depois se render aos cabrestos da humildade. Ao lembrar-me do passado, vejo os tantos entordilhados que circundam meu potreiro, são valores resguardados, ao ver o plano da vida...

“... Assim vou pelo cabresto nessa jornada comprida,
Com o lombo basteriado, trajetória que é doída...
Vendo junto dos assombros, que circundam meu potreiro
Um acesso frente as almas, guiando os passos noiteiros
Nos poemas instigantes de memórias – congelados –
Crinas claras: – fragmentos –... Noite e frio: – entordilhados –...”

BOA SEMANA A TODOS!!! 

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