terça-feira, 10 de maio de 2011

FRAGMENTOS DE CHUVA

Friozito se achegando aqui na minha província, meu peito também gelado requisita a simplicidade de um velho mate, que traz consigo o vigor amargo num verde estendido em sinais de vida. Mas tão amargo é meu mate que chega adoçar meus pensamentos tal fosse um mel viscoso de um camoatim do capão. Uma garoa teimosa igual potranca mal costeada... Teimosa sim a garoa, vem batendo na minha janela, tal se estivesse me convidando a abrir a porta do rancho e contemplar seu corpo esguio escorrendo pelas costelas do morrinho em frente as casa, chegando a fazer um trilho, um caminho sem fim que se some, que se vai... Tão deliciosa é a alegria em que a chuvita me olha, me embalando sonhos chamameceros em seu rebolado ao desviar algum pedregulho. Fecho os olhos, morenos de saudade, meus lábios ressecados como um bocal esquecido num gancho de algum galpão tapereado, e o galope do meu coração ainda potrilho, por vezes arisco n’algum vaguear saudoso da alma, por vezes sereno ao cheiro molhado da terra essência, que é meu rincãozito singelo. Ah meus fragmentos!Minha história, meu passado, meu presente, meu futuro... Ontem meu bisavô palmeava uma cuia gateada junto a uma bombita de alpaca, já torta de tombos... Hoje eu olho pra chuva, ela me olha, meu mate é amargo, porém tão doce... Amanhã, é a terra que avisto na minha frente, regada com o beijo doce da sanguita que se forma entre os morros, um futuro de brotar da terra aquilo que é da terra e que prenuncia um passado com voz de presente, pra ecoar no futuro. Ah meus fragmentos! Um outono de cara nova me presentando o pelo arrepiado de um fio de lombo lobuno desse céu largo que me cerca, que nos cera... 
Fragmentos nos goles apurados, alpargata esfiapada, barba serrada, terra molhada... Fragmentos nas saudades longínquas, na solidão da sombra, no auto olhar da alma. Vai chegar a hora em que a água da chaleirinha preta vai lavar meu mate, como a água da nuvem tordilha vem lavar as pedras... Talvez renove a idéia, tempere a vida e costeie as penas. E eu me perca solito num bailado alpargateado, dançando com a sombra ao escutar um chamamé da chuva, um chamamé crescente que um rádio velho me oferta num quartinho escuro no fundo da casa... E assim eu bailo, bailo com a alma, bailo com o coração, bailo com a chuva... Pra resguardar aquilo que verte de dentro pra fora, de fora pra dentro e se espalha singelo pelos fragmentos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário